sexta-feira, 24 de outubro de 2014

O MITO ADÂMICO
O que pode ser tão ameaçador para o ser humano no campo das ideias, que não mereça a análise honesta por parte de cada um de nós? Tomemos a questão do evolucionismo como a ideia tão ameaçadora.

Em qualquer momento do cotidiano, seja nas relações de lazer, de trabalho, seja no convívio familiar, quando o nome de Charles Darwin é mencionado, torna-se bastante para o começo de incômodo social e fim do diálogo. É desconfortável, pois sentimos um processo de desafino em movimento. Ar constrangedor. Por que o nome de tão nobre cientista sempre é motivo de incômodo para o senso comum?

A partir de Darwin, a história foi dividida espontaneamente, não por convenção. Chegou-se a uma redutibilidade do estudo do ser humano. A abordagem redutiva, biológica, como método científico, mostrou que o homem não passa de um mamífero falante e a religião ficou de mãos vazias. A metafísica foi desfocada em detrimento da visão científica. Ora, a ideia central de Darwin é que, no processo de seleção natural, os organismos que se adaptam melhor ao seu ambiente do que outros produzem mais descendentes. Já os que não conseguem se adaptar não vão sobreviver.

Quando ocorre o processo de modificação sobre os organismos na natureza, é sempre de forma muito lenta, às vezes até em uma sucessão de eras. Se os seres vivos não se empenharem em luta ferrenha pelos lugares ainda não ocupados na economia da natureza, serão extintos em função dos seus concorrentes em escala da seleção natural. Em suma, é a persistência do mais apto nesse processo de organização natural. É uma ordenação cumulativa de variações na corrida do aperfeiçoamento desse progresso gradual e lento.

Darwin demonstrou que o homem descende de uma forma de organização inferior, de um ancestral comum, o que deixa os religiosos em desespero. E o mais impressionante nesse contexto é que a ciência não deixa mais dúvidas sobre a evolução das espécies. Na prática, é só pensar em nossas inclinações, reações e imprevisibilidades. Cada um de nós carrega o seu chimpanzé interior invariavelmente...

Parece que, depois de Darwin, a religião lançou mão de um recurso contumaz para rejeitar o óbvio. Um tipo de imperativo ético que fecha os olhos para o evolucionismo, que precisa ser afirmado acima de tudo, apesar das descobertas da ciência durante os últimos 150 anos. Esse imperativo “ético” criacionista pretende ignorar a razão. Para os que ainda sustentam tais ideias decadentes, não importa o quanto a ciência evolua e apresente ao mundo as provas mais convincentes. O que importa é a canonicidade dos livros... É preciso alimentar histórias miraculosas para que a sensação deificante nos preencha a mente.

A ideia de “ancestral comum” foi formulada em base às semelhanças entre grupos e registros de fósseis. Justamente nesse ponto surgiu a reação da sociedade da época, induzida pelo clero, que já temia perder o seu mercado de trabalho... Foi a Igreja que espalhou a ideia de Darwin ter declarado que o homem teria a sua origem nos macacos, mas ele jamais disse tal coisa. Apenas declarou que o homem é originário de um ancestral comum dos hominídeos e hominoides, um elo perdido no tempo.

Isto abalou a fé dos ingênuos e mais devotos. Aliás, a fé só é abalada quando a mente é abalada antes. Se a fé é um subproduto da mente, sendo ela afetada, apesar da contumácia biológica em continuar existindo, pode melhorar bem como subproduto. Pode ser lapidada e tornar-se até religião. A fé insiste em dizer que somos um imperativo do cosmo, mas no fundo pressentimos que não passamos de um acontecimento biológico aleatório. Assim, como vemos nos Estados Unidos, a resistência ao evolucionismo permanece fincada nos próprios currículos escolares do ensino médio, que tentam suprimir o assunto “evolução das espécies”. Para tal, inventaram uma saída para a questão: um contraposto curricular que vem com o disfarce intitulado de design inteligente ou “ciência da criação”. Isso tudo para conferir ares científicos ao ensino do criacionismo bíblico... Esse “design inteligente” nem de longe encontra base científica e não é, senão, teologia de péssima carpintaria... Um contributo à desinteligência dogmática.

Em um capítulo autobiográfico de suas cartas, Darwin demonstra honestidade e coragem de expor suas opiniões tão divergentes da sociedade tacanha do século dezenove: “O antigo argumento do design na natureza, criado por William Paley, anteriormente com aparência de algo tão conclusivo, desaba pelo fato do princípio da Seleção Natural. Não temos argumentos de que a articulação de uma concha bivalve possa ter sido criada por um ser superior, como a dobradiça de uma porta pelo próprio homem. Parece que há tão pouco design na variabilidade dos seres orgânicos e na seleção natural, quanto na direção em que os ventos sopram”...

Darwin era convicto sobre as questões científicas serem obrigatoriamente embasadas em provas e jamais se deixava levar por opiniões sem o devido fundamento dos fatos. Com seu espírito livre, mantinha-se independente para refutar as hipóteses pseudocientíficas, sempre que provocado pelos seus adversários.

Recentemente, cientistas falavam da presença do homo sapiens sapiens por aqui há 40 mil anos. Agora, falam que o homo sapiens já estava por aqui há, no mínimo, 120 mil anos. De certa forma, isto significa que os humanos evoluíram como qualquer outro animal sobre a face da Terra. Todo o empirismo de Darwin significava a própria natureza como cenário máximo, em particular, o mundo animal. Foi daí que concluiu que o que ocorria com os tentilhões, de forma diferente, também acontecia com os humanos.

Sempre há fortes postulados na história que dão origem a outras ideias e princípios geniais. Um desses casos foi o clérigo inglês, interiorano, Thomas Robert Malthus, 1766-1834. Mais tarde, escreveu o Ensaio sobre o princípio da população. Malthus apresentava uma linha de descenso quando a população atingia o seu auge numérico, devido ao início inevitável, cíclico, da escassez de alimentos – por decorrência óbvia do aumento populacional. Malthus foi o primeiro pesquisador a explicar como era mantido o equilíbrio entre as populações humanas. Se, por razões adversas, um determinado país fosse agredido pela fome, catástrofes e epidemias, e acontecesse uma explosão demográfica inesperada, sobreviria o desequilíbrio total nesse país. Se ainda continuasse o crescimento populacional, mais fome e miséria tomariam conta do cenário, logo se multiplicaria toda sorte de epidemias, misérias, com a consequente perda do controle social.

Malthus percebeu, concomitantemente, esses fatos aplicados ao mundo dos insetos: se as moscas se reproduzissem sem controle, sem os seus predadores, logo estaríamos com larvas até ao pescoço... Ora, em tudo é necessário o equilíbrio que a morte promove, através de um processo seletivo natural. Para Malthus, as populações cresciam geometricamente. Foi no ensaio de Malthus que Darwin encontrou o mecanismo para desenvolver o princípio do evolucionismo. Os organismos que conseguiam se reproduzir, não eram beneficiados pela sorte – eram fortalecidos pelas suas próprias condições de adaptabilidade às circunstâncias vitais. Malthus, na verdade, foi o primeiro pesquisador a explicar como era mantido o equilíbrio entre as populações humanas. Resumindo, a teoria "malthusiana" relacionou o crescimento da população com a fome, reiterando a tendência do crescimento populacional na forma de progressão geométrica e do crescimento da oferta de alimentos em progressão aritmética.

Darwin aplicou as ideias de Malthus aos animais e plantas e, em 1838, já tinha um esboço da teoria da evolução através da seleção natural. Durante os vinte anos seguintes, ele trabalhou com esse pensamento sobre sua teoria e outros projetos de história natural. Ele percebeu que Malthus tinha quebrado de alguma forma, as aspirações iluministas do século dezoito, nos ideais de possibilidade ilimitada de progresso, com o devido aperfeiçoamento humano. Sim, pois Malthus trouxe à tona os desequilíbrios naturais do planeta, como as epidemias, a fome, o desemprego, as crises sociais atípicas, que decompunham as ideias um tanto utópicas dos iluministas franceses.

Decompunham as ideias sim, uma vez que as populações se expandem geometricamente com mais rapidez que os recursos restritos às áreas disponíveis. As políticas embasadas nas pretéritas teorias econômicas de Malthus, hoje não se demonstram efetivas, pois para sanar crises de fome de uma determinada população, formam-se projetos para gerações subsequentes, que já contarão com populações muito mais numerosas... De qualquer maneira, em todas as épocas da história, o elemento regulador é o extermínio natural dos organismos vivos.

Darwin encontrou em Malthus, no estudo das populações adultas dos organismos vivos, diferentes possibilidades de sobrevivência de descendentes de várias espécies, que de per si propunham explicações da evolução natural dessas várias espécies... Desta feita, por alguma analogia, Darwin propôs o seguinte: “Se entre tantas condições inconstantes da existência, os seres organizados apresentam diferenças individuais, em quase todas as partes de sua estrutura e este ponto não é contestável; se há, entre os indivíduos, em razão da progressão geométrica do aumento de indivíduos, uma encarniçada luta pela existência numa certa idade, numa certa estação, ou durante um período qualquer da vida, e isto não é certamente contestável; tendo, então, em conta a infinita complexidade das relações mútuas de todos os seres organizados e das suas relações com as suas condições de vida, o que causa uma diversidade infinita de estruturas, de continuações e de hábitos, seria deveras extraordinário que jamais tivessem sido produzidas variações úteis à prosperidade de cada indivíduo, da mesma forma como se produzem tantas variações úteis ao homem. Mas, se de fato se apresentarem algumas vezes variações úteis a um ser organizado qualquer, seguramente os indivíduos em que se apresentam têm maior probabilidade de vencer na luta pela existência; e, em virtude de tão poderoso princípio da hereditariedade, tendem a deixar descendentes caracterizados da mesma maneira. Dei o nome de seleção natural a este princípio de conservação ou de persistência do mais apto. Este princípio conduz ao aperfeiçoamento de cada criatura relativamente às condições orgânicas e inorgânicas de sua existência; e, por conseguinte, na maior parte dos casos, aos que podem considerar como um progresso de organização. Todavia, as formas simples e inferiores persistem muito tempo quando são bem adaptadas a condições pouco complexas de sua existência”. [Darwin, vida e pensamentos – Martin Claret, 1997].

Depois de lançadas bases do evolucionismo no século dezenove, o mundo virou de ponta cabeça. O princípio da seleção natural solapava inexoravelmente a narrativa mirabolante do Gênesis, que descreve a criação do homem. O bispo de Oxford, Samuel Wilberforce, foi o representante da Igreja com mais empenho em desmoralizar Charles Darwin na sua teoria da seleção natural. Mas em todas as investidas reptílicas, nos debates era sempre exposto à vergonha, pelos argumentos anêmicos e sem base científica alguma. A esposa do infeliz bispo de Oxford chegou a comentar com as senhoras da igreja local: “Essa agora... Espero que essa teoria não seja nada verdadeira... Mas se for, vamos correr e rezar para ninguém descobrir”...

Desde a morte de Darwin, o desespero dos religiosos católicos e protestantes se espalhou pelo mundo. O que fazer agora, que a ciência provou por todos os meios que o homem não nasceu sapiens? O que fazer do boneco de barro e todo o romantismo construído em torno dele? Descobrir lá pela terra santa alguns pergaminhos que mude a história do casal do Éden? Não dá! Já foi tudo bem canonizado... Não pode surgir mais nem um palito. Não foi preciso mexer com coisas perigosas desde a Idade Média. Agora, surge um obstinado inglês do século dezenove para encher sempre o saco dos devotos... Para que sabermos verdades, se temos tantas ainda desconhecidas? Ciência demais enjoa – deixai vir as Alices. Estava tudo caminhando mais ou menos harmônico, bem resolvido, mas em cima do palco.

Bem, surgiu uma primeira ideia de acomodação. Em 1998, o papa João Paulo II, apertado pelos cientistas do mundo, admitiu a possibilidade da evolução darwiniana vinculada ao cristianismo. Ora, mas desde que a primeira bactéria surgida no planeta tenha sido criada por Deus.

Para a abordagem de um assunto tão polêmico, é necessário entendermos que o criacionismo só pode ser sustentado, ipsis litteris[i], sobre uma base de crença absoluta na Bíblia. Melhor dizendo, hiperdogmática.
Teria, assim, o mundo “seis dias” para ser elaborado e o dilúvio precisaria ser encarado como fato histórico. Contudo, há grupos religiosos que não interpretam a Bíblia de forma tão rigorosa: admitem que não haja muitos conflitos entre a criação divina e a evolução das espécies. Bem, a mensagem foi enviada pelo papa João Paulo II, conforme comentado. Para a Pontifícia Academia de Ciências de Roma e declarou que a teoria de Darwin “é bem mais do que uma hipótese...”, admitindo que “se o corpo humano é originário de substâncias preexistentes, a alma tem que ser imediatamente criada por Deus”. Com essa, o pobre Darwin se debateria no caixão... Mas, pelo menos, não deixou de ser um recomeço. Para os dogmáticos, a comprovação de fósseis de milhões de anos e as datações radioativas pouco importam. Não servem para nada, pois o argumento é que não existia ninguém naquela época para comprovar qualquer fato... É a cegueira do sectarismo fossilizado.

Qual o propósito, então, da teoria evolucionista? Simplesmente, demonstrar como algo se desenvolveu a partir da sua origem e não como esse algo começou. Veja-se que o papel do criacionismo está subordinado à dogmática: o fato explicado através dos princípios fideístas, onde jamais se encontrará base científica alguma. A exposição de um fato pela fé é sempre extraída de um mito ou de um livro convencionado santo. Totalmente concebido para não ser discutido. É autoritário, por isso vai encontrar na dogmática o seu imperativo absoluto.    Existe um imenso abismo entre a verdade e a mentira; a ciência e o senso comum. Sendo a verdade a relação de conformidade entre o conhecimento e o objeto conhecido, ela se torna lógica quando os conceitos são verdadeiros, ao corresponderem de forma completa à realidade. Mas se torna ontológica quando as coisas concebidas são verdadeiras ao corresponderem de forma completa às nossas ideias. A verdade lógica, ou do pensamento, é o conceito adequado ao real e a verdade ontológica é a realidade adequada ao conceito.

Para a Escolástica, o summum bonum[ii] é a própria verdade, o objetivo precípuo de todo pensador. Uma atitude de culto à verdade, como a dos judeus a Adonai ou, até mesmo, a dos muçulmanos a Alá. Entretanto, o reconhecimento do primado da verdade supera qualquer tipo de fé e isso é prerrogativa de poucos.

Nós humanos somos a única espécie que sabe que vai morrer e que descobriu a dúvida. Portanto, a única espécie que lançou mão da fé, pois descobriu a mentira. A fé dos filósofos, entretanto, não é cega, é de resultados. Então, não é fé? Porque fé é, apenas, crer no que não se vê, nas histórias inventadas pelos outros? Crer no que se prevê? Mas não é necessária a comprovação para que a fé se solidifique? Se for só na razão que o filósofo crê, sendo a verdade o objeto maior, ela permanece soberana. Por que não repensar a fé? A verdade está à disposição de vários métodos para ser atingida, não é para uns apenas, e cada qual descobre o que pode. É absoluta? Em que termos? É o primado da verdade que importa.

Nem todos têm medo de Deus, mas todos temem a verdade. Ela não requer defesa, pois é pétrea e imutável. Quando oculta, não deixa de ser verdade. Ela é, pois o tempo não a altera. O que significa que, mesmo que não houvesse ninguém para testemunhar certo degelo catastrófico na pré-história, em algum lugar, uma vez havendo os indícios científicos, sabemos que este degelo ocorreu simplesmente. A verdade que aquele degelo constituiu no tempo não pode ser alterada. Os milênios passam, mas nada pode desfazer a expressão da verdade daquele determinado degelo. Um registro inconteste no tempo. Um fato consumado em verdade.

Só a partir do século dezenove, a Bíblia deixou de ser a única explicação ocidental para a origem da vida. Quero, então, abordar o princípio evolucionista para, depois, falar sobre o criacionismo. A ciência entende uma datação para fixar a existência da Terra de 3.5 a 4 bilhões de anos, enquanto que, para os teólogos cristãos, a idade do planeta estaria na casa dos sete mil anos...

Infelizmente, a maioria das organizações protestantes fecha os olhos para qualquer tipo de consideração sobre o evolucionismo: não aceita evidências nem provas científicas. Com o avanço do saber científico, torna-se inexequível a conciliação da ciência com qualquer tipo de escritura religiosa, mormente quando interpretada ao pé da letra.


Embora a minha abordagem seja filosófica, farei uma análise, em seu aspecto símplice, da história geológica, sem a qual será inviável tecer considerações sobre o evolucionismo.

A era geológica inicial foi a Primitiva, ou Pré-Cambriana. De certo, o primeiro período foi o Hadeano, época da constituição do nosso sistema solar: um imenso conjunto de gases e poeira sideral. A formação do Sol ocorreu dentro de uma nuvem de gás, ao processar uma grande fusão nuclear e, depois, emitir luz e calor.

A poeira orbitante ao Sol, ao se agregar, formou planetésimos, que por sua vez compuseram planetas maiores. A Terra, envolvida por milhares de vulcões, propiciou uma atmosfera primitiva composta por gases de nitrogênio e dióxido de carbono. Nos primeiros oitocentos milhões de anos, a superfície da Terra se transformou do estado líquido ao sólido. Gases como o sulfeto de hidrogênio, metano e amônia, compuseram as atmosferas primitivas do planeta, anaeróbicas[iii], até que, a priori, os primeiros organismos iniciassem o processo de fotossíntese, passando a produzir o oxigênio.

O segundo período foi o Arqueano, quando a crosta terrestre então esfriou e as placas continentais principiaram sua formação. Absolutamente tóxica, a atmosfera compunha-se de gases de amônia e metano. A abordagem de um modelo evolucionista se dá a partir desse cenário dos primórdios.

Correntes científicas têm como base o surgimento de moléculas orgânicas na Terra. A princípio, os procariontes, seres unicelulares, grosso modo conhecidos como bactérias, foram formas de vida mais simples aqui encontradas como fósseis. Eram fotossintéticos e com datação de mais de três bilhões de anos. Fato curioso é que a vida primitiva no planeta, num processo lento, foi representada apenas por bactérias por mais de um bilhão de anos.

De acordo com Oparin[iv], o acúmulo de moléculas em águas lacustres ou marinhas passou a compor o “caldo primordial”. Nesse composto, já se formavam os coacervatos[v], moléculas orgânicas agrupadas que foram os primórdios das células nos oceanos primitivos. Após a ocorrência de evolução química, apareceram moléculas orgânicas ainda mais complexas que em condições próprias vieram a configurar as primeiras células. Essa é uma das teorias científicas básicas sobre a origem da vida.

O período seguinte, Proterozoico, foi muitíssimo longo. Os continentes se estabeleceram e a vida se desenvolveu com a presença do oxigênio na atmosfera. Um período que vai de 2.5 bilhões a 540 milhões de anos.

Tem início a respiração aeróbica. As etapas de evolução celular até aqui ocorreram sem oxigênio, debaixo d’água ou bem distantes das radiações solares. O surgimento do oxigênio na atmosfera ou nas águas veio, na realidade, exterminar muitas formas de vida e criar adaptações para outras. Dessa maneira, os organismos mutantes passaram a povoar as águas oxigenadas.

Como o oxigênio surgiu dos seres fotossintetizantes, chegaram seres unicelulares que evoluíram dos procariontes, os eucariontes. Houve, então, a primeira grande extinção no globo terrestre, pois os recentes organismos não se adaptaram ao aparecimento da nova atmosfera. Inicia-se, devido à oxigenação, a reprodução sexuada.

O assunto evolucionismo, hoje, é repensado de uma maneira a serem considerados os bilhões de anos que foram documentados cientificamente. Fora isso, permaneceremos na visão do senso comum, criacionistas sem argumentos sólidos, científicos.

Seguiu-se ao Proterozoico, o período Ediacarano, último da era Pré-Cambriana, onde encontramos os fósseis macroscópicos mais antigos. Passado o tempo primitivo, assentou-se a era Paleozoica, responsável pela aceleração evolutiva dos seres multicelulares. Seu primeiro período foi o Cambriano (de 540 a 490 milhões de anos), que o caracteriza pela descoberta do maior número de registros fósseis de pequenos seres mineralizados: braquiópodes, trilobitas, archaeocyatideos, equinodermos, etc. O clima, regra geral, era ameno sobre o planeta, sem nenhuma glaciação. Então, aparecem os seres com conchas, carapaças – os agnatos[vi]; abundantes algas marinhas e os primeiros vertebrados.

Seguiu-se o período Ordoviciano (de 490 a 440 milhões de anos), quando o hemisfério norte era quase oceano e houve a definição do primeiro continente no hemisfério sul, o Gondwana. Existem indícios de invasão de plantas aquáticas sobre a superfície terrestre e de evolução de vegetais primitivos para plantas vasculares. O continente Gondwana se deslocou um pouco para o sul, permitindo o aparecimento das grandes geleiras maciças, de seres marinhos agigantados e diversificação, agora em maior escala, da vida oceânica.

Veio, então, o período Siluriano (de 440 a 410 milhões de anos), havendo o degelo das calotas polares, tornando a terra mais úmida e favorecida à reprodução dos artrópodes[vii], que conquistaram a vegetação rasteira dos continentes. Aparecem, ainda, os peixes com mandíbulas e plantas sobre toda a área terrestre.

O período Devoniano (de 410 a 360 milhões de anos) dá origem às plantas com sementes e às árvores, através da fertilização, ao propiciar a formação de florestas. Ocorre, então, o desdobramento evolutivo dos insetos, dos primeiros anfíbios tetrápodes[viii] e dos peixes com couraça e ossos, os ancestrais do tubarão que hoje conhecemos.

O período Carbonífero (de 360 a 280 milhões de anos) se tornou o responsável pelo início da glaciação no hemisfério austral e, também, pela consolidação das grandes florestas tropicais com a formação dos primeiros depósitos significativos de carvão. Adveio o ovo com líquido amniótico em certas espécies, permitindo que o embrião não ficasse mais dessecado, o que aumentou muito a possibilidade de êxito na geração dos mesmos. As florestas ficaram cada vez mais densas, com vegetação agigantada de esporos e tecidos vasculares, chamadas de pteridófitos.

O período Permiano (de 280 a 245 milhões de anos) foi o último da era Paleozoica. Houve a expansão das gimnospermas[ix], a extinção dos corais primitivos, a propagação dos insetos, uma copiosa diversificação dos répteis primitivos e a extinção das trilobitas[x]. Assim, através dos fósseis, registra-se a maior cessação de seres marinhos e terrestres desde a formação do planeta.

O Paleozoico deu lugar à era Mesozoica ou intermediária. Seu primeiro período foi o Triássico (de 245 a 208 milhões de anos), quando os pterossauros e os dinossauros apareceram sobre o globo terrestre. A grande extinção dos seres do Permiano estendeu-se ao Triássico, época do predomínio do supercontinente Pangea, quando apresentou sinais de fragmentação. Como a atividade vulcânica era formidável, transformava enormes áreas em deserto. As coníferas, em toda parte, se espalharam profusamente, sob um clima quente e úmido, ao permitir a multiplicação de samambaias gigantes, porém sem flores.

Os primeiros animais do período foram anfíbios, crocodilianos e rincossauros[xi]. Já a fauna marinha não oferece muita variação, devido ao vasto extermínio no final da era Paleozoica. Na Terra, por fim, surgiam os dinossauros. Nesse período, encontramos três categorias de rochas: o arenito fluvial vermelho, o calcário marinho fossilífero e os arenitos continentais.

O continente Pangea unia todas as placas continentais e era cercado por um vasto oceano chamado Panthalassa (atual Oceano Pacífico) e por um pequeno mar a leste do Pangea, chamado Tethys (Mar Mediterrâneo).

O período seguinte, Jurássico (de 208 a 144 milhões de anos), teve a maior aceleração evolucionista até então. Os dinossauros, pterossauros, répteis aquáticos se diversificaram e surgiram as aves primitivas.

O Pangea se fragmentou de vez definindo melhor os outros continentes: Laurasia e Gondwana. O nível das águas subiu e invadiu as áreas baixas da Terra. Essa foi a causa do extermínio de grande parte dos seres vivos no planeta.

O Cretáceo, último período do Mesozoico (de 144 a 66 milhões de anos), marca o fim da era dos dinossauros. Houve o extermínio total dos sauriópodes pesados e dos estegossáurios, para dar lugar ao apogeu dos anquilossáurios, carnossáurios, e ceratópsios.

Apareceram sobre a Terra as angiospermas[xii], plantas com flores que passaram a colorir as florestas. No final desse período, houve a extinção massificada dos dinossauros, uma dinastia que durou perto de 150 milhões de anos.

A paleontologia identificou mais de 350 espécies destes monstros que aqui viveram. O seismossáurio, considerado o maior herbívoro conhecido, media em torno de quarenta metros de comprimento. O Tyrannosaurux Rex, um dos maiores carnívoros, tinha perto de doze metros de comprimento e pura voracidade.

Os dinossauros se dividem em dois grupos: os de pélvis de lagarto (saurisquios), que compreendem tanto herbívoros quanto carnívoros e os de pélvis de ave (ornistiquios), cujas espécies eram herbívoras. Há uma tese científica de que a extinção dos dinossauros se deve a impactos sucessivos de grandes meteoros sobre a terra. Quem, pois, conseguiria imaginar a existência desses animais, se não tivéssemos a prova de sua presença no planeta, através de milhares de fósseis autênticos?

Após a era Mesozoica, segue-se a Cenozoica, dividida em dois tempos: o Terciário (que vai de 66 milhões a 1.8 milhões de anos) e o Quaternário (de 1.8 milhões de anos até os dias de hoje).

O primeiro período do Terciário foi o Paleoceno (de 66 a 57 milhões de anos), início da propagação dos mamíferos, aves, insetos e flores. Ocasião do domínio dos mamíferos na vida animal, devido, é lógico, ao desaparecimento dos dinossauros.

Seguiu-se o Eoceno (de 57 milhões a 34 milhões de anos). Surgem os insetos polinizadores. Começa a diversificação nas formas e dimensões dos mamíferos, os quais passam a habitar toda a terra nos seus ambientes mais variados: rios, mares e continentes, em locais mais quentes ou frios. São os mamíferos primitivos que dão origem aos animais de hoje, circulando pela Terra.

No terceiro período, Oligoceno (de 34 milhões a 21 milhões de anos), acontece a ocupação total e desenfreada dos mamíferos em todos os continentes. Os animais atingem seu maior porte e causam a extinção de espécies mais antigas de mamíferos. O clima permanece quente e úmido, o que enseja o aparecimento das pradarias, assim como o das campinas.

O quarto período foi o Mioceno (de 21 milhões a 10 milhões de anos), momento em que surgem as grandes cadeias montanhosas como os Alpes, os Andes e o Himalaia. Houve o choque e a agregação de dois continentes: a placa africano-arábica com a placa asiática, causa da extinção do mar que as separava. A partir daí, as faunas se mesclaram, com novos confrontos e mudanças entre as espécies animais.

O último período do Terciário foi o Plioceno (de 10 milhões de anos a 1.8 milhões de anos), período em que surgem os Australopithecus. Houve um esfriamento global depois do Mioceno e despontaram braços de terra que ligavam os continentes, permitindo migrações em massa de animais e vegetais devido às intermináveis glaciações.

O Quaternário produziu seu primeiro período, o Pleistoceno (de 1.8 milhões a 11 mil anos atrás), auge das espécies animais e aparecimento do homem sobre a Terra. Tem início a idade glacial no Hemisfério Norte. Despontam o Homo erectus, o Homo sapiens e os primeiros traços culturais humanos: as pinturas rupestres.

No Pleistoceno, abundavam os mamíferos e aves de grande porte: os mastodontes, mamutes, tigres de dentes de sabre, búfalos gigantes, etc. Nesse mesmo período, todos eles foram extintos com a vinda do ser humano e as violentas mudanças climáticas. Configurava-se um tempo de intensas glaciações.

O segundo período do Quaternário é o Holoceno (de 11 mil anos até os dias de hoje). Caracteriza-se pelo fim da última idade glacial, com intenso desenvolvimento do homem e surgimento da civilização. É no Holoceno que temos o registro de toda a história da humanidade. Não pude preterir desta modesta e resumida explicação, pois os primórdios da vida no planeta não devem ser reduzidos a fantasias de livros infanto-juvenis. É preciso que se entendam todas as etapas que passamos para chegar até aqui. E não foi um “puf” instantâneo, como entendem os mais acanhados intelectualmente.


[i] Literalmente.
[ii] Supremo bem.
[iii] Atmosfera sem oxigênio.
[iv] Aleksandr Ivanovich Oparin (1894-1980) – bioquímico russo, influenciado por Darwin, desenvolveu a teoria evolucionista da “sopa prebiótica”.  
[v] Microgotas ricas em polímeros que ficam em suspensão na água.
[vi] Peixes primitivos sem mandíbulas.
[vii] Divisão do reino animal que compreende os invertebrados de exosqueleto quitinoso, providos de apêndices articulados pares: insetos, aracnídeos, crustáceos e miriápodes.
[viii] Animais com quatro patas ou nadadeiras.
[ix] Plantas dicotiledôneas de sementes nuas. 
[x] Espécime de crustáceo dos terrenos primários.
[xi] Lagartos com bicos.
[xii] Plantas que têm sementes revestidas de pericarpo distinto.

Se, realmente, a ciência é a única resposta para a humanidade, e de certo é, todas as religiões não passam de adereços. O pior é que sabemos disso! Mas somos hipócritas, esmolamos por lendas para suavizar o horror da existência – da seleção natural –, onde não existem Alices, tampouco o país das maravilhas. Mas, na hora em que as coisas ficam pretas, apelamos para os antibióticos com mais confiança do que nas orações. A reza sempre acompanha os horários dos medicamentos, mas eles é que não podem faltar... Optamos por tomografias, cintilografias, cateterismos e outras intervenções quando estamos em risco. Com certeza, antes das teologias de antanho. Por que, então, defendemos o universo das poções mágicas? Porque fugimos do mundo real – queremos os mágicos, os atores e os sacerdotes. São eles quem nos contam historinhas de ninar. Analisamos as eras geológicas; o bóson de Higgs; a escalada do genoma humano; a expansão do megaverso e outras descobertas. Será que depois disso vamos continuar chamando o primeiro homem de Adão?

Os criacionistas, que ainda ensaiam sair da Idade Média rumo ao iluminismo do século dezoito, dizem que os australopithecus; o homo erectus; o homo habilis; o homem de cromagnon e o homem de neanderthal não foram antepassados do homo sapiens... Foram meio-humanos, meio-animais, mas não guardavam nenhuma relação com o homem pronto, com o boneco de barro colocado no jardim das delícias.

Esse boneco de barro ainda precisa ser protegido politicamente durante um bom tempo. É ele quem nos faz culpados. É ele quem motiva um deus para que entre na carne humana e morra na cruz... “Ah... Mas Adão e Eva eram apenas simbólicos”... Dizem algumas facções cristãs mais hábeis. Então, o pecado também era simbolismo? “Credo”! Dizem outras facções com mais aparência de devoção. E completam: “As torturas foram reais e a ressurreição também”!... Mas como? Então, foi tudo motivado por um casal inexistente? Assim provam todas as teorias científicas sobre a origem da vida na Terra. Vamos sair do colégio? Da universidade? Vamos queimar os livros? Vamos colocar os verdadeiros professores, que ensinam ciência de fato, na fogueira da santa inquisição? Vamos ensinar nossos filhos a regar e colher mentiras plantadas por nós?

Sabemos que é um mito da Antiguidade o primeiro homem surgir pronto de um boneco de barro. Só se for uma existência conceitual, convencionada, que os medievos discutiam naqueles tempos. Eles não tinham inventado ainda o computador. E como seria esse deus que fez um boneco de barro, suposto praticante do pecado original? Todo mundo já tem na ponta da língua que Deus é um só. Fácil, não? Assim, aprendemos do senso comum e preferimos abafar a nossa mente, deixando de pensar. A Bíblia explica, mas Freud também. De uma coisa desconfio: talvez tenha sido esse deus que ensinou o tio Gepeto a fabricar o Pinóquio... Só que foi de madeira.

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